CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ

Sessão: 156.1.54.O Hora: 16:57 Fase: CP
Orador: EDIO LOPES, PMDB-RR Data: 16/06/2011

O SR. EDIO LOPES (PMDB-RR. Sem revisão do orador.) - Muito obrigado.

Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, há 4 anos, quando cheguei a esta Casa, apresentei proposta de emenda à Constituição que recebeu o número 117. Foram apensadas diversas outras propostas de emenda à Constituição, ao longo do tempo, sobre o mesmo tema.

A nossa PEC, Sr. Presidente, refere-se ao art. 231 da Constituição, que trata da demarcação das terras indígenas no Brasil.

É fato inquestionável que as demarcações de terras indígenas no Brasil têm tomado rumos verdadeiramente inaceitáveis, em muitos casos.

A título de preâmbulo, Sr. Presidente, quero dizer aos que nos assistem que o Deputado Edio não é, absolutamente, contra as demarcações de terras indígenas. Muito pelo contrário, entendemos que é preciso, urgentemente, definir a totalidade das áreas indígenas no País, mas com bom senso e não da forma como estão sendo feitas.

A nossa proposta acaba de receber um brilhante parecer na CCJ do Deputado Osmar Serraglio, do PMDB do Paraná. Queremos acreditar que esta Casa não vai continuar adiando indefinidamente a definição dessa questão.

Inúmeros são os exemplos que permitem afirmar que as demarcações de terras indígenas no Brasil, da forma como estão sendo feitas, não atendem às necessidades do País, muito menos aos interesses da maioria das comunidades indígenas brasileiras. Um exemplo bem recente é o de Raposa Serra do Sol, questão recém-decidida pelo Supremo Tribunal Federal.

Recentemente, a revista Veja publicou matéria de três ou quatro páginas que ilustra o caso e, muito mais do que isso, nos adverte para a situação dessas imensas reservas logo após sua demarcação.

Em Roraima, indígenas que viviam na região... Cito o exemplo da índia Coema, casada com um nordestino, e seus 8 filhos. A FUNAI entendeu que ela não poderia continuar na Reserva Raposa Serra do Sol, a menos que o seu esposo e seus filhos saíssem da reserva. E aquela indígena, nascida e criada naquela região, pegou quase 200 reses que possuía com seu marido e foi para a terra do branco, para a capital.

Não se passaram 2 anos, Sr. Presidente, e a família hoje não tem mais uma cabeça de gado, mora em cima do lixão da capital, Boa Vista, em um barraco feito com restos de construção, e vive de catar lixo.

Isso comprova que as demarcações, da forma como estão sendo feitas no Brasil, não atendem às necessidades do País, muito menos dos indígenas.

E há alguns exemplos absurdos. Em Santa Catarina há uma reserva indígena sendo demarcada no oeste do Estado, em uma região em que há décadas não se ouvia falar em índio, nem em descendentes, tal a miscigenação que ocorrera ao longo dos últimos séculos. E a FUNAI, com seus antropólogos, entendeu que ali havia vestígios indígenas.

Pior ainda: a FUNAI ou as ONGs que proliferam ao redor daquela instituição trouxeram algumas famílias indígenas do Paraguai, que não falavam à época "bom dia" em português, e lá as instalaram.

No Paraná, hoje, neste momento, a FUNAI está buscando demarcar quase 20 mil hectares em uma área densamente povoada, com 100% de pequenos agricultores. Nessa área há mais de 50 anos, Presidente, não se ouve falar, não se tem notícia do rastro de um único indígena.

Alguma coisa está errada! Em relação à reserva Raposa Serra do Sol, no laudo do Grupo de Trabalho da FUNAI que se criou em 1982 há um cidadão, um professor da USP que consta como sendo o técnico em economia que elaborou o parecer do ponto de vista econômico da futura reserva Raposa Serra do Sol e dos efeitos da demarcação sobre o resto do Estado. Está lá nos autos. Só o Supremo não quis ver.

Eis que, quando se começa a investigar a questão, esse grande professor da USP diz em juízo: "Eu nunca fui a Roraima. Pior ainda: eu nunca soube que participei desse grupo de trabalho".

Ora, as fraudes nas demarcações de terras indígenas desde muito tempo são notórias! Há laudos antropológicos feitos por antropólogos que, às vezes, nunca pisaram naquele Estado ou naquela região. E isso serve para balizar toda a demarcação de uma terra indígena.

O que nós queremos com a nossa PEC? Queremos que as demarcações de terras indígenas passem por esta Casa, porque se passassem pelo crivo e pela discussão ampla desta Casa, não haveria esses casos estapafúrdios, Sr. Presidente. Eu duvido muito que se fossem objeto de lei as demarcações de terras indígenas, a FUNAI ousaria trazer a esta Casa uma proposta de demarcação de terra indígena onde há 50, 60, 100 anos não existe notícia de um único indígena.

A forma como se conduz esse processo no Brasil não atende às necessidades do País, muito menos das comunidades indígenas, porque tudo é feito para demarcar. Depois de demarcadas, as áreas são abandonadas, os índios são relegados à marginalidade! A FUNAI, uma instituição falida e desacreditada, sem recursos, não tem como fazer frente às necessidades dessas comunidades, e os Estados e Municípios, mesmo querendo, também não podem fazê-lo.

Sr. Presidente, na maioria das vezes, um gringo que não sabe falar português chega a Boa Vista, na Amazônia, e duas horas depois entra na área dos Ianomâmis. Mas eu, Deputado Federal, para ir a uma dessas aldeias, talvez tenha de falar com Sua Santidade, o Papa. Eu teria de pedir à FUNAI, que teria de falar com o Ministro da Justiça. Terminaria o meu mandato e lá eu não pisaria.

Sr. Presidente, essa é a realidade nua e crua das comunidades indígenas do País.

Em São Paulo eu conheço a aldeia dos Guaranis, em Parelheiros. São 26 hectares de terra, uma chácara onde vivem quase 500 indígenas passando fome, doentes, dentro da grande São Paulo. Por que os defensores dessas áreas extraordinariamente grandes, na Amazônia e em outros Estados, não vão para a rica São Paulo dizer que aqueles 500 índios guaranis precisam de 10, de 20 ou de 1 milhão de hectares de terra? Porque lá tem peso político.

Era isso, Sr. Presidente.

Muito obrigado.