CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ

Sessão: 070.3.54.O Hora: 17:02 Fase: OD
Orador: GORETE PEREIRA, PR-CE Data: 16/04/2013

PRONUNCIAMENTO ENCAMINHADO À MESA PARA PUBLICAÇÃO

A SRA. GORETE PEREIRA (Bloco/PR-CE. Pronunciamento encaminhado pela oradora.) - Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, venho hoje tratar de um assunto que tem preocupado todos aqueles comprometidos com o desempenho da nossa economia e com a competitividade dos nossos produtos no mercado global. Refiro-me à precariedade da malha viária brasileira, à falta de investimentos nos portos, rodovias e ferrovias do País, ao caos na logística da exportação dos nossos produtos agrícolas, que têm roubado toda a extraordinária vantagem conquistada pelo agronegócio nacional em eficiência e produtividade.

Este quadro ficou muito flagrante nas imagens da fila de 25 quilômetros de caminhões carregados de grãos, principalmente milho e soja, na Rodovia Cônego Domênico Rangoni, esperando até 70 horas para descarregar no Porto de Santos, no mês passado. Naquela fila o País perdia preciosas divisas, frustravam-se os esforços dos produtores rurais, evaporavam-se as margens de lucro das empresas de agronegócios.

Não se pode afirmar que o Brasil foi pego de surpresa por uma supersafra agrícola. Na verdade, a produção nacional de grãos vem crescendo progressivamente há mais de uma década, e, com planejamento adequado por parte do Estado, este caos logístico poderia ter sido, se não evitado completamente, pelo menos muito amenizado.

Nos últimos 12 anos, a safra brasileira de grãos dobrou de tamanho, mas quase nada foi feito para melhorar nossa infraestrutura. Enquanto no Brasil 55% da distribuição de grãos acontece por estradas esburacadas, nos Estados Unidos, nosso principal concorrente, hidrovias construídas há mais de 80 anos são responsáveis por 60% do transporte de grãos.

Quando a produção, depois de enfrentar milhares de quilômetros de buracos e de descaso, chega finalmente aos portos, outro drama tem início. Como no Brasil o carregamento dos navios é feito a céu aberto, a chuva interrompe a operação, e só este ano já foram mais de 20 dias parados, o que atrasou muito o embarque do milho.

Este ano, em razão da quebra da safra americana do milho, tornamo-nos o maior exportador mundial do grão. A expectativa é de que 25 milhões de toneladas sejam exportadas, o triplo da safra passada. Sem dúvida, é uma boa notícia, mas esse volume colossal de milho fará com que a logística dos nossos portos fique ainda mais complicada.

O embarque do milho está atrasando os embarques de soja, que vão afetar os embarques de açúcar a partir de deste mês e de milho safrinha a partir de julho. Além disso, vivemos a situação paradoxal de termos desabastecimento de milho no Nordeste, porque a CONAB não consegue distribuí-lo em razão das dificuldades no transporte.

Sr. Presidente, nobres colegas, a agricultura brasileira é um orgulho nacional. Responsável por sucessivos superávits na nossa balança de pagamentos, gera preciosas divisas para o País e contribui para reduzir a pressão dos preços dos alimentos na inflação, propiciando maior fartura na mesa dos brasileiros.

Esta pujança deve-se, em primeiro lugar, à competência e à perseverança dos 30 milhões de agricultores brasileiros, que, em silêncio, a despeito das dificuldades, continuam plantando, agregando novas tecnologias a todas as etapas do cultivo e produzindo a custos cada vez menores. Não é justo nem razoável que, na hora de comercializar sua produção, quando dependem das estradas, das ferrovias e dos portos, sejam abandonados pelo Estado à própria sorte.

Mas não é só no transporte que estão os gargalos da nossa logística. A falta de armazéns é outro grave problema enfrentado pelos produtores nacionais, obrigados a vender a safra toda de uma vez, o que contribui para engarrafar rodovias e portos. Hoje só conseguimos estocar 65% dos grãos produzidos no País. O caminhão, por esta razão, tornou-se um verdadeiro "armazém sobre rodas", situação cuja precariedade agrava a desvantagem nacional em relação aos nossos principais competidores.

Os danos causados ao País por esta falta de planejamento estratégico são muito sérios. Recentemente, um grande importador chinês cancelou o carregamento de 33 navios de soja, trocando o suprimento brasileiro pelo da Argentina. Não fica difícil entendermos a opção chinesa quando sabemos que, se 10 anos atrás, o custo do frete no Brasil era "apenas" duas vezes superior ao da Argentina e ao dos Estados Unidos, este ano, numa visão otimista, será, no mínimo, quatro vezes superior, chegando a ser até sete vezes maior para as regiões mais distantes do Centro-Oeste.

Num quadro como este, não podemos aceitar os sucessivos adiamentos na entrega de obras como a da Ferrovia de Integração Oeste-Leste, que cruza o País do interior ao litoral e que vai agilizar muito o transporte de carga das Regiões Nordeste e Centro-Oeste. Esta ferrovia, uma das principais obras do Programa de Aceleração do Crescimento, terá uma extensão total de 1.527 quilômetros, com investimentos estimados em 6 bilhões de reais, e constituirá o eixo ferroviário horizontal do País, de importância crucial para a logística do nosso transporte de cargas. Ela ligará Ilhéus, na Bahia, a Figueirópolis, no Estado do Tocantins, onde fará conexão com a Ferrovia Norte-Sul.    No Município de Ilhéus, na localidade de Aritaguá, a linha férrea se interligará ao Porto Sul, por onde será possível escoar a produção de grãos do Centro-Oeste. Isso atenuará muito o fluxo de caminhões no sentido Porto de Paranaguá, reduzindo significativamente o custo do frete. É, pois, uma obra estratégica para o transporte da produção agrícola nacional, e esperamos que não haja novos adiamentos no seu cronograma.

Sr. Presidente, todos esses problemas que relato, ocasionados pela falta de logística do nosso transporte de cargas, têm prejudicado muito a Região Nordeste, que desde o ano passado enfrenta uma das piores secas registradas nos últimos 50 anos. E, mais uma vez, comprovamos a insuficiência das políticas oficiais para possibilitar à população a convivência com as adversidades do clima.

O Brasil precisa prestar atenção nestes números: a estiagem afeta hoje quase 10 milhões de pessoas, e mais de 1.200 Municípios, em 9 Estados, estão em estado de emergência. Portanto, mesmo que os efeitos diretos da falta de chuvas atinjam só a Região, o problema é, na verdade, nacional, uma vez que envolve cerca de 5% da população e 22% dos Municípios do País.

Como todos sabem, não se trata de um problema novo. Os registros existentes indicam que o Nordeste já enfrentou 72 grandes períodos de estiagem desde que os descobridores portugueses chegaram ao Brasil, há 513 anos. Nesse longo tempo, mudaram os enfoques sobre a questão, mas o sofrimento do sertanejo foi apenas atenuado, não deixou de se repetir a cada seca.

Em artigo publicado há dias no jornal O Povo, de Fortaleza, o agrônomo Ricardo Lima de Medeiros Marques, da Secretaria dos Recursos Hídricos, observou que, no Ceará, já se conseguem evitar as perdas de vidas humanas e as grandes migrações das populações interioranas em decorrência da escassez de água e alimento. Porém, acrescentou ele, ainda é preciso criar condições adequadas para manter os rebanhos de forma plena.

Isso resume, de modo simples, o que está acontecendo no meu Estado. O Ceará avançou no que diz respeito ao abastecimento de água, principalmente para o consumo humano. De 2007 a janeiro deste ano, o Governo Estadual investiu grande volume de recursos próprios na construção de poços e implantação de cisternas. Recentemente, no dia 19 de março, por meio de parceria do Estado com o Banco Mundial, envolvendo, em várias etapas, o total de 400 milhões de dólares, foram liberados 90 projetos de abastecimento de água para comunidades rurais do interior.

Por outro lado, está em licitação a primeira etapa do Cinturão das Águas, um projeto que, totalmente implantado, atenderá 93% do território cearense. Dessa forma, o Estado se antecipa à transposição do Rio São Francisco, para ter condições de aproveitá-la assim que esteja concluída.

A manutenção da atividade agropecuária, entretanto, continua enfrentando grandes dificuldades a cada período de estiagem. Segundo a Federação da Agricultura e Pecuária do Estado, 110 mil cabeças de gado, de um rebanho que era de 2,7 milhões, já morreram por falta de alimento. Essa é uma situação absurda, Sr. Presidente!

Aproveito a oportunidade para fazer uma crítica e um apelo ao Instituto Chico Mendes. O Ceará possui reservas como a Chapada do Araripe, Serra da Ibiapaba, Serra da Meruoca, Floresta Nacional Araripe-Apodi, e, emergencial e excepcionalmente, o Instituto deveria flexibilizar as diretrizes ambientais a fim de permitir a alimentação do gado nessas áreas. Seria uma alternativa para conter a morte do gado e de forma controlada e preventiva alimentá-lo sem comprometer a biodiversidade. Entendo que o animal é tão importante quanto o meio ambiente. Ademais, é um contrassenso a morte do rebanho, sendo que o Brasil colhe uma safra recorde de milho.

Como nunca é tarde para agir, no dia 2 de abril, a Presidenta Dilma Rousseff participou da 17ª reunião do Conselho Deliberativo da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE), em Fortaleza, com a presença de nove Governadores da Região e do Ministro da Integração, Fernando Bezerra, para lançar programa que garante mais recursos para combater a seca.

Destinada aos produtores do Semiárido e para minimizar o sofrimento do gado no Sertão, o Governo baixou a Medida Provisória nº 610, de 2013, autorizando a CONAB a doar milho aos Estados. Como a MP beneficiou somente pequenos criadores, propusemos a inclusão dos médios, que pagariam 20% a mais do valor cobrado dos pequenos criadores. Essa medida é importante, tendo em vista a dificuldade de se distinguir essas duas categorias no Semiárido.

Além disso, nós nordestinos cobramos políticas preventivas e estamos esperançosos com as ações do Governo Federal para garantir a sobrevivência do gado e melhorar as condições de vida do sertanejo.     

Ainda no que se refere à atuação federal, entendo que outra medida para contribuir na execução de políticas públicas para o Ceará é a criação de uma Superintendência da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (CODEVASF) no Estado, assunto objeto do nosso Projeto de Lei nº 5.349, de 2013.

Dessa forma, evitamos que os 20 Municípios cearenses da área de atuação da CODEVASF fiquem relegados a segundo plano, pois estão vinculados à Superintendência do Piauí, que atende nada menos que 222 Municípios daquele Estado.

Sr. Presidente, nobres colegas, passo agora a abordar tema que tem mobilizado prefeitos, governadores, gestores públicos e outras lideranças nacionais, dentro e fora do Parlamento. Refiro-me à necessidade de redesenharmos o pacto federativo nacional, hoje reconhecidamente injusto em relação aos Municípios, que não recebem da União repasses compatíveis com suas crescentes responsabilidades, e injusto, também, em relação aos Estados mais pobres da Federação.

O desequilíbrio é brutal. Há enorme injustiça na distribuição dos recursos públicos entre os entes federados. A União é privilegiada e concentra grande parte do bolo da receita. Ao longo dos anos, desde a promulgação da nova Constituição, ela tem repassado cada vez mais novos encargos aos Municípios nas áreas de saúde, educação e infraestrutura, mas não repassa os recursos necessários para atender a estas crescentes atribuições.     

Faz-se absolutamente necessário e urgente, pois, que se revejam os critérios de distribuição do Fundo de Participação dos Estados - FPE, até porque as atuais regras foram declaradas inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal e a extensão do prazo que a Corte nos deu para aprovar as novas regras terminará em junho próximo.

Na verdade, o Congresso Nacional não conseguiu ainda apreciar a questão da partilha do FPE por duas razões. Uma delas é que todos os projetos em análise no Parlamento que criam novos critérios de divisão do FPE tiram recursos dos Estados mais pobres do País, os Estados das Regiões Norte e Nordeste, em especial da Bahia, do Ceará e do Maranhão, e isso nós, representantes das populações desses Estados, não vamos aceitar.

A outra razão é que estávamos esperando uma definição a respeito da redivisão dos recursos dos royalties do petróleo, de maneira que uma medida equilibrasse a outra. Felizmente, prevaleceu o bom senso na questão dos royalties, e o Parlamento derrubou o veto da Presidenta Dilma Rousseff, que afrontava decisão tomada pela maioria absoluta de Deputados e Senadores.

Com uma redistribuição mais equitativa dos royalties entre todos os Estados federados, será possível reduzir as desigualdades sociais e regionais, um dos objetivos fundamentais da Federação, conforme expresso no art. 3º da Constituição, e diminuir o endividamento de Estados e de Municípios. A partir dessas novas bases, creio que será possível chegarmos a um acordo sobre as novas regras para a distribuição dos recursos do FPE.

Sr. Presidente, nobres colegas, antes de concluir o meu pronunciamento, gostaria de dizer algumas palavras sobre o desenvolvimento da atividade pesqueira no meu Ceará. Somos o maior produtor nacional de tilápia, camarão e lagosta, e o quarto maior produtor de pescados do País. Atualmente, 92,2 mil das 300 mil toneladas anuais de pescados produzidas no Brasil saem do Ceará, e temos como meta dobrar esta quantidade até o final do próximo ano.

Para tanto, serão necessários a expansão da aquicultura, a modernização da pesca e o fortalecimento da indústria e do comércio pesqueiro. A expansão da aquicultura é fundamental, porque os recursos naturais tendem ao esgotamento, e a pesca como atividade extrativista terá que dar, cada vez mais, lugar à piscicultura.

Segundo o Ministério da Pesca e Aquicultura, o crescimento da criação de peixe em cativeiro, no Brasil, com destaque para a tilápia, mas incluindo também a carpa, o tambaqui e o curimatã, tem sido de 6,6% ao ano nas últimas décadas, o dobro do crescimento médio mundial.

A legislação em vigor permite a utilização de 1% dos 218 reservatórios federais para a aquicultura, o que equivale a 55 mil hectares de lâmina d'água. Especialistas avaliam que, se este 1% fosse efetivamente utilizado, o Brasil teria potencial de produção anual de pescados equivalente ao da China, que é de 60 milhões de toneladas.

O mais bem-sucedido exemplo da aquicultura nacional está no Açude cearense Castanhão, o maior açude para usos múltiplos da América Latina. Lá, empresários, associações, cooperativas e até ex-pescadores já produzem 14 mil toneladas anuais de pescado. E ainda estão longe de esgotar o potencial do Açude, que é de 34 mil toneladas anuais.

O Castanhão tem sido palco de um dos mais inovadores projetos na área de biocombustíveis. É o Projeto Piloto Biopeixe, de responsabilidade do Núcleo de Tecnologia Industrial do Ceará, realizado com piscicultores da região de Jaguaribara. O Projeto tem como objetivo a fabricação de um equipamento capaz de extrair óleo das vísceras dos peixes para transformação em biodiesel pela PETROBRAS. E os resíduos resultantes do processo ainda poderão ser transformados em ração animal, num notável exemplo de aproveitamento integral do pescado.

A atividade pesqueira desempenha papel central na economia cearense, e por isso acompanhamos, com muita expectativa, a execução do Plano Safra da Pesca e Aquicultura, lançado em outubro do ano passado pelo Governo Federal. O Plano vai disponibilizar 4 bilhões de reais em linhas de crédito aos 970 mil pescadores registrados no Brasil, para que renovem sua frota e seu equipamento. Esperamos que estes recursos beneficiem cerca de 300 mil famílias brasileiras, retirando mais de 100 mil delas da extrema pobreza.

Sr. Presidente, nobres colegas, precisamos resgatar a dignidade dos trabalhadores das águas, engajando-os no projeto de dobrar a produção anual de pescados no País até o final de 2014. Os desafios são grandes, há muito o que se fazer, mas com competência, coragem e determinação, em parceria com estes extraordinários trabalhadores que são os nossos pescadores e piscicultores,    estou certa de que conseguiremos nos tornar uma potência pesqueira mundial.

Era o que tinha a dizer.